xok:

agora... adentre: entre: se toque, se pop, se top, me provoque!

5.1.11

antes do peito na ponta da faca.

  aconteceu by azulchoque 

o coração salpicou dum espasmo, por dentro do peito.
um grito.
raios e trovoadas fortes.
eram guitarras?
o corpo se saracoteia da cama ao espaço. um vácuo entre isso e aquilo, um canto de salvação que perdeu voltando a pisar no chão.
de pé percebe este chão molhado, a porta aberta, o carro ensopado por dentro, as plantas naufragadas.
e o tapede daquela sala?
seu corpo suado guardava um cheiro, mas ela não lembrava de quem.

só sabia do banho de chuva, do porre, da volta pra casa esbravejando ira e risadas.
seu sexo molhado da chuva. pêlos que guardaram um resto de água?
e um cheiro... que abuso daquele cheiro!

Ela ainda não morreu. sim, porque ela morre no fim desta história, senão não seria Carmen.

macho, esquece. ou finge que esquece, a verdade é que doerá sempre menos em seu peito de macho.
a noite ela lembra de um cacho que teve. e ele tinha medo de escuro, de trovões, de fortes chuvas e se enroscava toda em seu braço.
era dele o grito que a chamara da cama. ela sabia. de algum jeito ouvia.
chovia.
mulher canalha. ela sempre se achava necessária, sempre se pensava útil, a coitada.
ser mulher assim e ter um jeito forte de ser rejeitada.

decidiu buscar o moço antes que anoitecesse. claro que ele não viria, não gritara, não chorara, como nem se quer havia chovido tanto assim. trovãozinho de nada, pensava. um gosto de vingança na garganta.
porque pra ela era tudo saída premeditada. ela era uma sacana mesmo. e sabia ter um risinho de canto de boca.

essa página da história é pra sabermos mais dela. sim, porque ela fica pra lá e pra cá, zombando, sorrindo, provocando. ela bate. e ela alisa! ela deixa um cheiro forte nas roupas que veste. e esse cheiro fica. entranha-se no corpo de quem corpo a corpo se tine com ela.

ela estava aqui a pouco. fumou um cigarro careta charmosamente desajeitada. porque nunca fuma, apenas pra... ela sabe. chega! e nunca interessa. nada dela interessa, a não ser que ela queira que interesse. é incrível como ela acha prazeroso vacilar entre ser adorável e péssima, insuportável, chata, ridícula e cruel, irritante... ah, mulher miseravelmente adorada! desprezível!

antes de sair pela manhã, de deixar mais uma vez a cama, ela quase vira-se para trás, quase me olha no rosto, no olho, na boca desbeijada, quase me fala. ela de vez enquando é sempre quase. apenas quase!

nela existe um medo. de pé no chão molhado, diante do final de uma rua, direita ou esquerda?

pensou. claro que calada, mas pensou.

havia uma impossibilidade. claro que secreta.

dois caminhos.

de um lado a perfeição diante de uma passado distorcido e turvo. uma segurança, uma proteção, um cuidado, um dono pra sua casa, um rapaz mais novo, no entanto mais velho, um rapaz firme, forte, cuidadoso, carinhoso, secreto, secretíssimo, segredo mais íntimo, só dela, e ele era tudo aquilo que sonhara, que pedira, que esperara, ele era um desenho por ela mesma esboçado e refeito, perfeito!

do outro lado a realidade clara, farta, escancarada, sem grande graça, sem cores brincantes pelas paredes da sala, sem luzes, sem charme, sem molho, sem fome, sem sede, sem nada. não! sem nada nunca. o outro caminho era de uma realidade descabida, um cheiro ainda mais forte e sem medo, sem desespero de esconderijos, o cheiro! o gosto não sabia, mas tinha, porque o cheiro, ah, o cheiro indicava! e o outro caminho, este, de tão real, de tão sem graça, de tão perdido, assim como ela, era mesmo a graça de tudo, a festa do que é real, do que é possível, do que talvez comece errado e nunca termine errando sempre. mas o encanto deste caminho era a falta de segredo. era essa a novidade. por isso abandonara minha cama e partiu. porque virando para a esquerda ela poderia ser acariciada em público, beijada, tomada no colo, paquerar, nunca sufocar um beijo, nunca rejeitar o impulso de um desejo! e ela queria isso. precisava.

seu ódio é porque queria tudo isso, esse possível, essa realidade, esse passo certo, esse abraço em público por horas em demora, era comigo que queria tudo isso. mas eu não podia! nunca podia! eu... eu não posso. eu sou de claustros e só sei amar em casa, só sei beijar em casa, só sei ser assim, porque sou Gabriela, descabidamente como eu nasço eu morro. pronto. falei. sou franco. sou um fraco! e me acabo sem pedir socorro achando bonito.

mas ela não. nunca. é fortíssima, Carmen que sabe ser, macho que sabe ser, homem mesmo! por isso ela saiu. simples assim. eu fiquei somente com o cheiro se acabando aos poucos na cama, na roupa, no corpo, no quarto, na casa, no espaço e no tempo.

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